sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Condenado por estupro de menor, Sefer perde outra no STJ: caso volta ao TJ do Pará


VER-O-FATO | por Redação | 04/11/2021

O rumoroso processo que envolve o ex-deputado estadual paraense Luiz Sefer, condenado a 21 anos de prisão por estupro de uma menina de 9 anos que à época trabalhava na casa dele – hoje, ela já é adulta e está fora do estado, protegida pelo Programa de Proteção a Testemunhas e Vítimas de Abuso – teve mais um desfecho desfavorável ao réu.

Em decisão do último dia 27 de outubro, obtida com exclusividade pelo Ver-o-Fato, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por ampla maioria e com apenas um voto vencido, os ministros julgaram procedente a Reclamação do Ministério Público do Pará em recurso assinado pela procuradora de Justiça, Ubiragilda Pimentel. Essa reclamação contestava decisão do TJ do Pará, que em abril de 2019, num julgamento bizarro, anulou todo o processo contra Sefer.

Em resumo: com a nova decisão do STJ, o processo já retornou a Belém para que o Tribunal de Justiça julgue a dosimetria da pena contra o ex-deputado, ou seja, se mantém, aumenta ou diminui a condenação dele a 21 anos de prisão. O caso já transitou em julgado e não cabe mais qualquer outro recurso que modifique ou anule a sentença condenatória, mantida em 2018 pelo próprio STJ..

Decisão polêmica em 2019

No dia 25 de abril de 2019, num julgamento inusitado e para lá de polêmico, a Terceira Turma de Direito Penal do TJ do Pará, por 2 votos a 1 decidiu reinventar a roda jurídica, tornando nulo  todo o processo contra Sefer. A tese do advogado Roberto Lauria foi aceita pelos desembargadores Mairton Carneiro, relator, e Maria Edwiges Lobato. O desembargador Leonam Cruz votou contra o recurso da defesa.

A revisão da pena de 21 anos e a multa de R$ 120 mil, que estavam na pauta, sequer foram julgadas. No começo daquela sessão, o desembargador Mairton Carneiro informou que havia um “incidente processual”, no caso um agravo regimental transformado em agravo interno, provocado pelo advogado Roberto Lauria, defensor de Sefer.  O agravo tinha preferência sobre os outros dois temas, porque determinaria o rumo do caso. E que agravo era esse?

Segundo recurso de Lauria, todo o inquérito policial instaurado para apurar o caso de estupro contra a menina seria nulo, porque a autorização para a abertura de tal inquérito teria de ser dada pelo Tribunal de Justiça do Estado em razão de Sefer ostentar na ocasião o foro privilegiado por sua condição de deputado estadual. Acontece que Sefer, à época, já havia renunciado ao mandato para não ser cassado. Portanto, não tinha mais o amparo do foro privilegiado.

A promotora do MP usou da palavra e repeliu a tese da defesa, lembrando que já havia se passado oito ano da condenação e só agora o advogado de Sefer estava atravessando uma petição querendo tornar nulo o inquérito policial. Ela lembrou que “acertadamente” o desembargador Raimundo Holanda havia indeferido a pretensão do advogado, considerando “extemporânea e incabível” a autorização do Tribunal de Justiça  para a lavratura do inquérito policial contra Sefer. “Foro privilegiado é para julgamento e não para a fase de investigação”, afirmou a promotora.

Roberto Lauria, ao defender sua tese, que ele chamou de “inédita”, inicialmente reconheceu que oito anos atrás ainda não atuava na causa do ex-deputado. Portanto, não poderia tê-la arguido, o que fazia na ocasião por entender que o recurso era “matéria de ordem pública”. Disse ainda que não estava preocupado se sua petição seria ou não desentranhada dos autos.

“O pedido guarda harmonia com a decisão do STJ”, argumentou o advogado, acrescentando que a petição poderia ” ser julgada até de ofício”. E mais: sua tese, repetiu, por ser “inédita”, não de mérito, mas de ordem pública, obrigava o Tribunal a lhe dar uma resposta. No final de sua oratória, Lauria ressaltou que o próprio desembargador Mairton Carneiro já havia “detectado uma prescrição nos autos”, acolhendo a tese de nulidade do inquérito policial por não ter autorização do TJ.

Não deu outra. Mairton Carneiro começou sua explanação indo direto no assunto, ou seja, derrubando o inquérito policial. Disse que defendia a nulidade absoluta do processo. Num longo voto, dando razão ao advogado do ex-deputado, o desembargador, sempre seguindo o entendimento de que o processo não tinha qualquer validade e que tudo deveria “voltar ao juiz natural”, no caso à juíza Graça Alfaia, que havia condenado Sefer. Disse que a falta de autorização do TJ “contaminou todo o inquérito”.

 Quer dizer, a denúncia do Ministério Público também de nada valia. Houve “usurpação de competência” do TJ, que segundo o desembargador deveria ter autorizado o inquérito. Em vista disso, todas as provas contra Sefer seriam nulas. “O presente recurso de agravo regimental, em sede de agravo interno, merece ser acolhido”, resumiu Carneiro. Votou para que o processo volte ao juízo de origem para que tudo comece do zero.

O revisor do caso, Leonam da Cruz Junior, discordou de Carneiro, afirmando não ter visto no recurso qualquer prejuízo à defesa de Sefer na coleta de provas. Lembrou, a respeito disso, voto da ministra do STF, Carmem Lúcia. “Vejo o pedido de nulidade como natimorto”, disse Leonam. Segundo ele, discordando de Carneiro, o Código Penal, que é de 1941, não mudou até hoje, quando fala sobre a instauração do inquérito policial.

 Para Leonam, não se pode acatar a nulidade de toda a investigação, porque não há como sustentar argumentação nesse sentido. “Não pelo decurso do tempo, porque não encontro respaldo legal. Conheço do agravo interno em que foi transformado o agravo regimental, , mas não lhe dou provimento”. Por fim, disse que não é necessário a autorização do tribunal para colher depoimentos.

Sem justificar ou apresentar qualquer argumentação em seu voto , a desembargadora Maria Edwiges Lobato  concordou integralmente com as argumentações do relator, Mairton Carneiro, que já havia incorporado a tese apresentada pelo advogado Roberto Lauria, votando pela nulidade absoluta de todas as provas colhidas no inquérito policial e, por conseguinte, do processo que redundou na condenação a 21 anos de prisão em regime fechado de Luiz Sefer.

 STJ acolhe reclamação e suspende efeitos

Inconformada com a nulidade de todo o processo, a procuradora Ubiragilda Pimentel recorreu ao STJ em junho de 2019 e aquela corte de justiça acatou o recurso do Ministério Público, determinando a suspensão dos efeitos do acórdão proferido pelo TJ do Pará, que havia reconhecido a nulidade do processo.

Ubiragilga afirmou, no fundamento da Reclamação, que o tribunal paraense havia “afrontado a soberania de decisão do STJ, na medida em que recebeu o aditamento às razões de apelação anteriormente apresentadas, e reconheceu nulidade do processo, por incompetência, determinando a remessa dos autos ao juízo de primeiro grau para nova instrução”.

O relator do caso em Brasília, ministro Joel Ilan Paciornik, foi taxativo: “vislumbra-se a ocorrência de possível desrespeito à autoridade de decisão dessa Corte, considerando-se que a determinação foi de retorno aos autos para julgamento dos demais pedidos constantes das razões de apelação já apresentadas”.

Agora, após a Reclamação julgada pela Terceira Seção do STJ, o processo volta ao Pará para que o TJ faça, enfim, o que não fez: julgar a dosimetria da pena – se mantém 21 anos de condenação, mais ou menos, e se aplica multa de R$ 120 mil.

É uma novela que, ao que tudo indica, desta vez não terá capítulo extra no TJ paraense.

A íntegra da decisão do última dia 27 de outubro é a seguinte:

“Certifico que a egrégia Terceira Seção, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: ” retomado o julgamento, após o voto-vista antecipado do sr. Ministro Ribeiro Dantas, julgando procedente a reclamação, acompanhando o voto do Sr ministro relator, os votos dos senhores ministros:

Olindo Menezes – desembargador convocado do TRF 1a Região – Jesuíno Rossato – desembargador convocado do TJDFT -, Laurita Vaz – com recomendação de que o julgamento da apelação seja retomado com brevidade – Sebastião Reis Júnior, Rogério Schiett Cruz e Antônio Saldanha Palheiro no mesmo sentido, e o voto do Sr ministro João Otávio de Noronha, não conhecendo da reclamação, a Terceira Seção, por maioria, julgou procedente a reclamação, com recomendação de celeridade  na conclusão do julgamento da apelação, nos termos do voto do Sr ministro  relator.

Vencido o Sr ministro, João Otávio de Noronha, que não conhecia da reclamação. Os senhores ministros Olindo Menezes, Jesuíno Rissato, Laurita Vaz, Sebastião Reis Júnior, Rogério Schiett Cruz, Ribeiro Dantas e Antônio Saldanha Palheiro votaram com o ministro relator, Ilan Paciornik. O julgamento foi presidido pelo ministro ReiYnaldo Soares 

 

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