Congressistas do partido ouvidos pelo jornal Folha de S.Paulo ressaltam a reforma administrativa proposta pelo governo como exemplo de que Bolsonaro jamais se preocupou com os servidores e dizem que o anúncio feito agora representa apenas a tentativa de reduzir sua alta rejeição popular.
"Recebemos como oportunismo político e medida eleitoreira. Depois de mandar a PEC 32 [reforma administrativa] para desestruturar o serviço público e criminalizar o servidor, ele vem com essa?", afirmou a deputada Gleisi Hoffmann (PR), presidente nacional do PT.
Parte da base eleitoral do PT é formada pelo funcionalismo, construída por governos que lançaram concursos públicos para preencher cargos vagos ou criados por novos ministérios. As administrações petistas também foram marcadas por uma política de ganho real para o salário mínimo.
Bolsonaro disse na terça-feira (16), no Bahrein, que pretende usar eventual aprovação da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios, que dá calote em dívidas da União reconhecidas pela Justiça, para dar reajuste a todo o funcionalismo, sem exceção. "Não é o que eles [servidores] merecem, mas é o que nós podemos dar", disse Bolsonaro na ocasião.
A PEC dos Precatórios libera cerca de R$ 90 bilhões do Orçamento por meio de artifícios como a mudança na forma como o teto de gastos regra que limita o crescimento das despesas é calculado, além de permitir o parcelamento do pagamento de precatórios, que são dívidas decorrentes de sentenças judiciais.
A emenda já foi aprovada na Câmara, mas enfrenta mais dificuldades no Senado, onde precisa passar por dois turnos de votação, com o apoio de ao menos 60% dos congressistas (49 de 81). Se alterada, terá de passar por nova votação na Câmara.
"Ele quer dar calote em dívida que já existe, é uma medida demagógica. Nós não somos contra dar aumento a funcionalismo, mas tem de ser visto dentro de um processo financeiro e fiscal do Brasil. Vindo dele, a gente sabe que não é porque ele tem o serviço público como importante para o Brasil, ele tem como importante para cabalar votos", disse Gleisi.
Líder da bancada do PT na Câmara, o deputado Bohn Gass (RS) afirmou não considerar séria a proposta.
"O PT sempre é a favor de reajuste para servidor, mas essa do Bolsonaro se trata de politicagem de quem sempre foi contra o servidor", afirmou o congressista, que também defendeu a retirada da reforma administrativa.
Enviada pelo governo em 2020, a reforma sempre foi vista como uma das mais difíceis de serem aprovadas por causa do forte lobby dos funcionários públicos no Congresso.
Aprovada em comissão especial da Câmara em setembro, ela está atualmente sem perspectiva de ser votada em plenário.
Na terça, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou não notar nem na sociedade nem no governo "disposição de enfrentar esse tema agora".
Para o líder da bancada do PT no Senado, Paulo Rocha (PA), a proposta de Bolsonaro de usar a PEC dos Precatórios para reajustar salários de servidores não passa de enganação. "Ele está se ferrando e quer se recuperar no funcionalismo, nas pessoas mais pobres."
O PT é atualmente o principal partido de oposição, tem a maior bancada da Câmara (53 deputados, mesmo número do PSL) e seis senadores. Seu candidato ao Palácio do Planalto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, lidera as pesquisas eleitorais.
Outros congressistas do partido também manifestaram considerar eleitoreira a proposta de Bolsonaro.
"Não que o servidor não mereça, mas lançar isso sem planejamento, sem algo pensado, é uma ação de puro desespero", disse o deputado Alencar Santana Braga (PT-SP).
"É apenas oportunismo político, uma medida eleitoreira, demagógica, até porque eles são autores da PEC que desestrutura o servidor público", afirmou Reginaldo Lopes (MG), que assumirá a liderança da bancada do PT na Câmara em 2022.
Para o deputado Rogério Correia (PT-MG), trata-se de mais "uma fake news presidencial". "Ele quer deixar como legado uma PEC [reforma administrativa] que permite cortar 25% do salário do servidor e quer agora dar reajuste com folga que será provisória? É apenas demagogia em véspera de eleição."
Bolsonaro não detalhou qual o percentual de reajuste pretende dar aos servidores nem a partir de quando.
O Ministério da Economia estuda há pelo menos três meses a possibilidade de um aumento para servidores.
O impacto fiscal decorrente de uma medida do tipo era estimado de R$ 5 bilhões a R$ 15 bilhões no começo das discussões, de acordo com interlocutores da equipe econômica ouvidos pela reportagem.
A PEC dos Precatórios dribla o teto de gastos e permite ao governo gastar mais R$ 91,6 bilhões em 2022 sem a necessidade de cortar outras despesas o que eleva o déficit nas contas públicas e o endividamento do país.
O Brasil está no vermelho desde 2014, sua dívida passa de R$ 5,4 trilhões e os custos com juros são pagos pela sociedade como um todo.
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