Agenda do poder | AMANDA MAGALHÃESPOLÍTICA | 3 DE MARÇO DE 2023 - 21:15 | Última atualização:4 de março de 2023 - 11:26
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O governo Jair Bolsonaro
tentou trazer ilegalmente para o País colar, anel, relógio e um par de
brincos de diamantes avaliados em 3 milhões de euros, o equivalente a R$
16,5 milhões. As joias eram um presente do governo da Arábia Saudita
para o ex-presidente e a então primeira-dama, Michelle Bolsonaro,
e foram apreendidas no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. Estavam na
mochila de um militar, assessor do então ministro Bento Albuquerque,
das Minas e Energia, que estivera no Oriente Médio na comitiva do
presidente, em outubro de 2021.
Ao saber que as joias foram
apreendidas, o ministro retornou à área da alfândega, e tentou usar o
cargo para liberar os diamantes. Foi nesse momento que Albuquerque disse
que o conjunto de diamantes era um presente do governo da Arábia
Saudita para Michelle Bolsonaro. A cena foi registrada pelas câmeras de
segurança, como é de praxe nesse tipo de fiscalização. Mesmo assim, o
agente da Receita reteve as joias, porque, no Brasil, é obrigatório
declarar ao Fisco qualquer bem que entre no País que passe de US$ 1 mil.
Nesta
sexta-feira, procurado pela reportagem, o ex-ministro admitiu que
trouxe para Michelle, mas afirmou que era um pacote fechado e não sabia o
que tinha dentro.
De acordo com o Estadão,
nos últimos dois meses que houve quatro tentativas frustradas de
Bolsonaro de reaver as pedras preciosas, envolvendo três ministérios
(Economia, Minas e Energia e Relações Exteriores) e militares. A última
ocorreu quando faltavam apenas três dias para deixar o mandato, em 29 de
dezembro. Um funcionário do governo pegou um avião da Força Aérea
Brasileira (FAB) e desembarcou no aeroporto de Guarulhos, dizendo que
estava ali para retirar as joias. O funcionário, que se identificou como
“Jairo”, argumentava que “não pode ter nada do [governo] antigo pro
próximo, tem que tirar tudo e levar”, conforme relatos colhidos pelo
jornal.
A reportagem localizou a solicitação para a FAB levar o
chefe da Ajudância de Ordens do Presidente da República, o 1º sargento
da Marinha Jairo Moreira da Silva, que foi para Guarulhos “para atender
demandas do Senhor Presidente da República naquela cidade e retornará em
voo comercial no trecho Guarulhos-SP para Brasília-DF”.
No dia
28 de dezembro de 2022, houve mais uma tentativa do gabinete do
presidente de reaver as peças. Desta vez, o próprio presidente da
República enviou um ofício ao gabinete da Receita Federal para solicitar
que os bens fossem destinados à Presidência da República, em
atendimento ao ofício 736/2022, da “Ajudância de Ordem do Gabinete
Pessoal do Presidente da República”.
Flagrante
A apreensão
ocorreu no dia 26 de outubro de 2021, durante uma fiscalização de rotina
entre os passageiros do voo 773 que desembarcaram nos terminais de
Guarulhos, com origem na Arábia Saudita. Após a passagem das malas pelo
raio x, os agentes da Receita decidiram fiscalizar a bagagem de Marcos
André dos Santos Soeiro, o assessor de Bento Albuquerque. Ao checar o
conteúdo de uma mochila, os fiscais se depararam com a escultura de um
cavalo de aproximadamente 30 centímetros, dourada, com as patas
quebradas. Dentro dela, encontraram ainda o estojo com as joias trazidas
para Michelle Bolsonaro, acompanhadas de um certificado de
autenticidade da marca Chopard.
A única maneira possível de se
retirar qualquer item apreendido pela Receita na alfândega – e isso vale
para itens com valor superior a US$ 1 mil ou mesmo joias milionárias – é
fazer o pagamento do imposto de importação, que equivale a 50% do valor
estimado do item, além de uma multa de mais 25%, pela tentativa de
entrar no País de forma ilegal.
No caso dos Bolsonaro, portanto, a
retirada formal e correta das joias apreendidas e estimadas em R$ 16,5
milhões custaria nada menos que R$ 12,375 milhões. Como o pagamento
estava fora de cogitação, o que restou foi recorrer aos órgãos do
próprio governo.
Depois de não conseguir retirar os itens na
alfândega do aeroporto, o Ministério de Minas e Energia envolveu outro
ministério na tentativa de reaver as joias para o presidente. Desta vez,
o MME acionou, em 3 de novembro de 2021, o Ministério de Relações
Exteriores. O Itamaraty, então, reforça a pressão sobre a Receita e pede
“providências necessárias para liberação dos bens retidos”.
Por
meio de uma “Nota Executiva”, porém, a Receita volta a negar e informa
que o único procedimento a ser adotado é o pagamento da multa e do
imposto.
O comando da Receita à época também entrou na
força-tarefa para liberar as joias. Os servidores da Receita, contudo,
que têm estabilidade na função e são funcionários de Estado, resistiram
às pressões e fizeram valer a lei.
Joias do tapete vermelho
A
marca Chopard é uma das mais famosas e caras do mundo. De origem suíça,
foi fundada em 1.860 e costuma ser utilizada nos tapetes vermelhos de
Hollywood.
O governo brasileiro poderia ter recebido as joias,
caso tivessem desembarcado como um presente oficial para o presidente da
República e a primeira-dama. Os bens, porém, ficariam para o Estado
brasileiro, e não com a família Bolsonaro.
Bento Albuquerque
confirmou à reportagem do Estadão que as joias trazidas ao Brasil da
Arábia Saudita eram, de fato, um presente para Michelle Bolsonaro.
Albuquerque,
porém, afirmou que desconhecia o conteúdo do estojo de joias. Segundo o
ex-ministro, os itens passaram pela alfândega saudita e embarcaram no
voo comercial, sem que ele e sua comitiva fossem questionados sobre o
conteúdo dos presentes. “Nenhum de nós sabíamos o que que eram aquelas
caixas”, disse Albuquerque.
No ato da apreensão dos itens, ao ser
questionado pelo agente da Receita Federal, Albuquerque relatou a quem
se destinavam os presentes. “Isso era um presente. Como era uma joia, a
joia não era para o presidente Bolsonaro, né… deveria ser para a
primeira-dama Michelle Bolsonaro. E o relógio e essas coisas, que nós
vimos depois, deveria ser para o presidente, como dois embrulhos.”
A
reportagem tentou contato com o ex-presidente Jair Bolsonaro. O
advogado Frederick Wassef, que se apresentou como representante do
ex-presidente, disse que não comentará o assunto.
Obs: Pode ser assinado ou anônimo.
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