domingo, 19 de dezembro de 2021

Orçamento secreto: cinco partidos foram ignorados na distribuição de emendas




BRASÍLIA - Partidos de oposição ao governo, embora tenham uma participação relevante no Congresso, foram menos contemplados no orçamento secreto do que legendas do Centrão e outros aliados do presidente Jair Bolsonaro — cinco legendas sequer receberam repasses. As informações foram obtidas a partir de um levantamento feito pelo GLOBO por meio do cruzamento de dados públicos, registros internos do governo federal, entrevistas e publicações em redes sociais de parlamentares.

A desigualdade na distribuição das emendas de relator foi criticada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ao suspender os repasses dos recursos, decisão revista posteriormente. Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia disse que o mecanismo representa uma “forma de cooptação de apoio político pelo Poder Executivo” que “afronta o princípio da igualdade, na medida em que privilegia certos congressistas em detrimento de outros” e “põe em risco o sistema democrático”.

Enquanto partidos do Centrão, juntos, lideram o ranking de número de parlamentares contemplados e o volume de recursos liberados pelo orçamento secreto, o PT, dono da segunda maior bancada na Câmara, teve apenas quatro de um total de 53 deputados beneficiados, segundo o levantamento. Integrantes de legendas da oposição à esquerda, como Rede, PSOL, PCdoB e PV, ou à direita, caso do Novo, nem sequer constam da lista dos congressistas que receberam emendas do relator. A análise foi feita em um universo de R$ 3,2 bilhões, uma amostra dos R$ 36 bilhões empenhados por meio do mecanismo em 2020 e 2021.

Para o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), o orçamento secreto representa a “institucionalização da corrupção”:

— Todo esse dinheiro é distribuído de forma fisiológica entre o Centrão e segue para o bolso de alguns parlamentares, alguns prefeitos e empresários como forma de compra de apoio no Congresso pelo Planalto. É a corrupção de forma institucionalizada, a realização dos sonhos do Centrão.

Além da base do governo ser a mais beneficiada, o cruzamento de dados mostrou que houve um empenho maior destinado ao Nordeste, totalizando R$ 1,5 bilhão. É de lá que vêm os principais caciques do Centrão contemplados com as emendas do relator, como o hoje ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), e o deputado federal João Carlos Bacelar (PL-BA). A região é considerada estratégica na pretensão de Bolsonaro de se reeleger em 2022. O presidente conta com o apoio de seus aliados, agraciados com o orçamento secreto, para aumentar a sua popularidade na região.

O mecanismo também serviu para agraciar parlamentares de partidos que não apoiam formalmente Bolsonaro, como o PSDB. A deputada Mara Rocha (PSDB-AC) foi a mais contemplada na legenda. Ela apadrinhou seis emendas, em um total de R$ 13 milhões empenhados a Acrelândia, Epitaciolândia, Capixaba e Manuel Urbano, cidades onde mantém redutos eleitorais junto com o irmão, o vice-governador do Acre, Major Rocha. Em novembro, a deputada causou um reboliço nas prévias do PSDB ao se declarar bolsonarista.

A própria parlamentar divulgou nas redes sociais que duas emendas foram encaminhadas por ela: R$ 1,1 milhão para a instalação de uma feira livre e R$ 900 mil para a edificação de um galpão para implementos agrícolas. “Mara Rocha acredita na força do produtor rural para desenvolver o Acre”, diz o vídeo promocional publicado em julho. Procurada, ela não se manifestou.

Num caso similar ao da tucana, o deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ) também consta no levantamento como o padrinho de uma emenda de relator de R$ 1 milhão destinada ao município de Iguaba Grande, na Região dos Lagos, para a pavimentação das ruas da cidade. O nome do parlamentar não consta oficialmente como autor da verba, mas nas redes sociais ele fez questão de publicar que é o “deputado federal recordista em emendas para a cidade”. Não à toa, ele é um dos principais aliados de Bolsonaro dentro da bancada do MDB.

Fundador da Associação Contas Abertas, o economista Gil Castello Branco defende que é preciso sistematizar a liberação das emendas de relator.

— O Congresso precisa estabelecer requisitos, limites, parâmetros ou critérios mínimos necessários para prevenir distorções e preservar o equilíbrio federativo na distribuição dos recursos. Da forma como estão sendo distribuídos os recursos, o Congresso não está reduzindo desigualdades, e sim ampliando-as.

 

https://br.noticias.yahoo.com/or%C3%A7amento-secreto-cinco-partidos-foram-123136224.html

 

 

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