Por: Duda Menegassi
Fonte: O EcoCom orçamento 30% menor para 2021 em comparação ao ano passado, a cúpula de diretoria do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ameaça suspender serviços de aeronaves para combate a incêndios florestais e fechar as brigadas caso não seja aprovado um aporte extra de pelo menos R$60 milhões ao instituto. O orçamento de 2021 está atualmente na mesa do presidente Jair Bolsonaro à espera de sanção ainda nesta semana e prevê uma verba de apenas R$177 milhões para o ICMBio, órgão responsável pela gestão de 334 unidades de conservação federais que protegem quase 10% do território nacional. O valor representa uma perda de R$72,6 milhões no montante total disponibilizado ao instituto em comparação a 2020; e de R$112,4 milhões comparado ao orçamento do órgão em 2019.
Em ofício ao qual ((o))eco teve acesso, enviado pelo Diretor de Planejamento, Administração e Logística (Diplan), Ronei Alcantara da Fonseca, ao presidente do ICMBio, Fernando Lorencini, no final de março, “o orçamento destinado ao ICMBio não seria capaz de cobrir as despesas mínimas para a manutenção de suas atividades básicas, o que poderia causar prejuízo às suas atividades finalísticas”.
Em seguida, o diretor aponta que caso não seja possível atender ao pedido de recomposição orçamentária, a Diplan sugere as seguintes medidas: fechamento das brigadas de incêndio a partir do dia 1º de maio de 2021; e a suspensão dos serviços de aeronaves para combate a incêndios florestais, suspensão da circulação da frota do ICMBio e a limitação de diárias e passagens, estas três medidas a partir do dia 1º de abril de 2021.
Conforme o ofício, as brigadas de incêndio teriam um custo previsto de aproximadamente R$61,1 milhões para 2021, “todavia os cortes somente serão legalmente possíveis (sem pagamento de indenizações) a partir de 1° de maio de 2021, o que totalizará o valor (maio-dezembro) de aproximadamente R$ 40 milhões”. Já o valor do contrato das aeronaves é de quase R$13 milhões e o do abastecimento e manutenção da frota do ICMBio é, respectivamente, de R$7,2 milhões e R$7,4 milhões, sendo que os cortes só seriam possíveis a partir do dia 1º de abril, o que representaria cerca de R$11 milhões (referentes ao período abril-dezembro).
O documento ressalta que os cortes podem ser feitos mesmo que caso a Diplan não fosse informada até o dia 1º de abril sobre a possibilidade de ampliação – ou não – do teto orçamentário, “uma vez que a data para efetivação dos cortes dar-se-á em 1° de maio de 2021 – prazo necessário para notificação das partes”.
Ainda de acordo com o texto, tais medidas poderiam trazer significativo impacto ambiental e um elevado prejuízo às atividades realizadas pelo instituto de fiscalização, prevenção e combate a incêndios, apoio à pesquisa, gestão socioambiental e monitoramento de espécies ameaçadas.
A proposta de orçamento enviada pelo governo ao Congresso destinava um valor ainda menor ao Ministério do Meio Ambiente. Foram os próprios parlamentares que definiram um incremento de R$275 milhões na proposta orçamentária, dos quais a maior parte foi destinada para melhoria da qualidade ambiental urbana, e rendeu cerca de R$4 milhões a mais para o ICMBio.
“Eles sabiam que o orçamento do ICMBio seria muito reduzido desde agosto de 2020, quando o governo federal enviou a proposta orçamentária e não fizeram nada. Inclusive o ICMBio participou dessa decisão, porque os órgãos são consultados. E deixaram para fazer agora, quando o orçamento já foi votado no Congresso e está só esperando a sanção [do presidente]. Eles reduziram muito o orçamento do ICMBio na parte de fiscalização e incêndios, e o relator no Congresso não botou dinheiro a mais nessa agenda”, pontua Suely Araújo, especialista sênior em Políticas Públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama.
De acordo com o orçamento aprovado pelo Congresso e que aguarda apenas a sanção presidencial, serão destinados R$80.385.460 ao Ministério do Meio Ambiente para “apoio à criação, gestão e implementação” das 334 unidades de conservação federais (função maior do ICMBio), o que representa apenas 47 centavos por hectare protegido por unidade de conservação federal (levando em conta as áreas terrestres e marinhas). Somadas as emendas parlamentares, o total para as UCs fica em R$101,45 milhões, o equivalente a 59 centavos por hectare.
Nas despesas referentes à fiscalização ambiental e prevenção, controle e combate a incêndios florestais, o MMA, como um todo, terá aproximadamente R$144,4 milhões. Com as emendas, o valor recebe um acréscimo de cerca de 8 milhões.
“O ICMBio está numa situação péssima. E não vai ser o Adote um Parque que irá suprir isso, primeiro porque ele não atende a todas as unidades de conservação e porque, até agora, as adoções divulgadas são só de pequenas unidades. É um raciocínio de quem não tem noção de gestão pública. Não é com um programa como o Adote um Parque e com a concessão de parques que você vai substituir o aporte de recursos da gestão pública”, continua a ex-presidente do Ibama. “E realmente vão ter que parar, não tem como. Vão matar [o ICMBio] por inanição”, completa.
O ofício menciona ainda que ações já foram aplicadas para reduzir os custos do ICMBio, assim que a diretoria tomou conhecimento da redução orçamentária prevista, já que o valor “não seria capaz de cobrir as despesas mínimas para a manutenção de suas atividades básicas, o que poderia causar prejuízo às suas atividades finalísticas” (Veja a lista completa das ações no box abaixo).
((o))eco entrou em contato com a assessoria de comunicação do Ministério do Meio Ambiente e do ICMBio para tentar obter esclarecimento sobre a possível decisão de suspender as brigadas e aeronaves de combate a incêndios e como ficará a proteção das unidades de conservação federais – missão central do instituto –, mas não obteve retorno até fechamento desta edição.
O ofício lista ainda as ações tomadas em 2020 diante do orçamento anterior, que mesmo com 72 milhões a mais do que o previsto para este ano, já foi considerado insuficiente para as despesas do ICMBio e resultou em: corte de 90% dos postos de motorista; retirada de 663 vigias e porteiros terceirizados, substituídos por cargos temporários de custo inferior; a criação dos Núcleos de Gestão Integrada (NGI), que centralizam a gestão de unidades de conservação; criação de cinco Gerências Regionais no lugar das 11 Coordenações Regionais e 6 Unidades Avançadas de Administração e Finanças; cortes em contratos de operadores de manutenção, técnicos de informática e outros; além da suspensão de contratos cuja execução foi impossibilitada em virtude da pandemia, como alimentação.
Não é a primeira vez que a questão financeira ameaça paralisar ações básicas dos órgãos ambientais, como fiscalização e o combate à incêndios. Em um destes episódios, em agosto de 2020, Salles ameaçou paralisar todas as ações de combate ao desmatamento ilegal no país por causa de supostos bloqueios financeiros ao Ibama e ICMBio.
A possibilidade de fusão
Em outubro de 2020, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, criou um Grupo de Trabalho para discutir a possível fusão entre ICMBio e Ibama, que deve elaborar um parecer sobre o tema até o começo de junho. A justificativa oficial por trás da união das autarquias (separadas desde 2007) é justamente otimizar “a máquina pública” e economizar recursos. De acordo com a analista do Observatório do Clima, entretanto, na prática, a fusão geraria muito pouca economia e, pior, paralisaria os órgãos.
“Na minha opinião, eles estão querendo criar o problema para vir com a solução [a fusão], porque eles não lutaram pelo aumento do orçamento do ICMBio. Acho que é uma coisa deliberada, para o ICMBio parar de funcionar e fazerem a fusão com o Ibama como se isso fosse a solução, mas não vai resolver, porque são duas autarquias com problemas financeiros e com sobreposição muito pequena de atividades. Então não vai resolver nada juntar com o Ibama. Além disso, as autarquias são muito distintas, as funções, os processos, se houver fusão eu acredito que irá gerar uma paralisação para adequação administrativa que vai durar pelo menos até o final do governo Bolsonaro”, aponta Suely Araújo.
Por: Duda Menegassi
Fonte: O Eco
Nenhum comentário:
Postar um comentário