sábado, 30 de janeiro de 2021

4 alternativas para financiar um jornalismo em crise

 

porANYA SCHIFFRIN
Jan 18, 2021 em EMPREENDEDORISMO DE MÍDIA




O relatório discutido neste artigo foi escrito pela Dra. Anya Schiffrin, Hannah Clifford, Allynn McInerney, Kylie Tumiatti e Léa Allirajah da Escola de Relações Públicas e Internacionais da Universidade de Columbia.

Em meio à pandemia de COVID-19, jornalistas de todos os lugares estão sentindo as consequências: cortes em redações, demissões e fechamentos varreram o mundo.

Filantropos, organizações de jornalismo, economistas e governos encontraram soluções para lidar com essa devastação financeira, alguns clamando por uma maior colaboração entre esses grupos. Em um novo relatório do Konrad Adenauer Stiftung, “Salvando o Jornalismo: Uma Visão para o Mundo Pós-COVID" (em inglês), analisamos iniciativas em todo o mundo que esperam salvar a indústria.

Nossa pesquisa observou um interesse renovado no financiamento por parte de governos e das Big Techs [grandes empresas de tecnologia] e uma ênfase na preservação do que existe, em vez de iniciar novos veículos que podem não sobreviver.

Para dar sentido às soluções propostas, nós as dividimos em quatro categorias, estabelecidas pelo diretor-gerente da fundação LuminateNishant Lalwani: fazer as Big Tech ajudarem a pagar pelo jornalismo, subsídios e suporte do governo, novos modelos de negócios e financiamento filantrópico.

[Leia mais: 5 elementos que organizações de jornalismo sustentáveis têm em comum]

(1) Fazer as Big Techs pagarem pelo jornalismo

Muitas das pessoas com quem falamos acham que é hora de conseguir com que as grandes empresas de tecnologia apoiem substancialmente o jornalismo e de envolver os governos para que isso aconteça.

Um exemplo abrindo caminho é o novo código de mídia da Comissão Australiana de Consumo e Concorrência, que forçaria o Google e o Facebook a pagar pelo jornalismo. Apresentada ao parlamento em dezembro, a lei exigiria que as empresas de tecnologia paguem pelas notícias que usam e as força a uma arbitragem vinculativa se não conseguirem chegar a um acordo sobre o valor. A lei também exigiria que as empresas de tecnologia notificassem os meios de comunicação antes de alterar os algoritmos que afetam o tráfego da audiência. Se aprovada, a lei criará uma relação mais equilibrada entre as organizações de notícias e as plataformas.

A Alemanha, Espanha e França tentaram usar leis de direitos autorais para fazer as Big Techs pagarem pelas notícias, mas a Austrália está tentando usar a lei de concorrência para mudar o equilíbrio de poder entre as empresas de tecnologia e mídia.

Esforços também estão em andamento nos Estados Unidos para fazer com que as empresas de tecnologia paguem pelas notícias, incluindo a proposta da Free Press de 2019 para taxar micro publicidade e, em seguida, usar os fundos para pagar o jornalismo cívico. Há também a lei bipartidária de Competição e Preservação do Jornalismo, que, se aprovada, permitirá aos editores se unirem ao negociar pagamentos com o Google e o Facebook.

(2) Subsídios públicos

No ano passado, também vimos um interesse renovado no apoio do governo ao jornalismo, inclusive na África e Estados Unidos, que tradicionalmente têm sido mais cautelosos com os perigos do financiamento público.

A Noruega, Dinamarca, Canadá, Austrália e Cingapura aumentaram o financiamento governamental extra e/ou créditos fiscais para apoiar o jornalismo durante a pandemia. Por exemplo, o governo da Austrália criou um fundo de notícias de interesse público de AUD50 milhões em maio para ajudar a manter o jornalismo de interesse público em áreas regionais. A Noruega e Cingapura forneceram subsídios para veículos e freelancers durante a COVID-19, e a Dinamarca dedicou DKK180 milhões para compensar os veículos pela perda de receita de publicidade entre março e junho de 2020.

Nos Estados Unidos, há uma série de propostas para apoiar as notícias, incluindo a Lei de Sustentabilidade do Jornalismo Local, que foi introduzida em julho de 2020. A lei proposta forneceria créditos fiscais federais aos meios de comunicação locais para assinaturas, compensação de jornalistas e publicidade. Os defensores esperam que alguns desses planos sejam votados em 2021.

No relatório, o jornalista queniano Mark Kapchanga argumenta que alguns veículos de notícias ameaçados devem receber assistência financeira do governo, mas que os fundos devem ser entregues de forma que os veículos possam manter sua independência com segurança, por exemplo, por meio do Conselho de Mídia do Quênia.

[Leia mais: Melhores práticas e erros comuns em modelos de membership]

(3) Novos modelos de negócios

Os inovadores também estão procurando ver que tipos de mudanças podem ser feitas nos modelos de negócios atuais para que o jornalismo de qualidade possa ser preservado no futuro. Na África do Sul, o jornalista de Botswana Ntibinyane Ntibinyane está buscando financiamento para o Projeto Transições Digitais que salvaguardaria a sobrevivência de veículos de jornalismo de qualidade na África do Sul e os ajudaria na transição ao longo prazo.

Nos Estados Unidos, 6.700 agências de notícias locais são propriedade de fundos de cobertura. Muitos profissionais da mídia estão preocupados porque esses fundos não estão interessados em apoiar o jornalismo ao longo prazo, mas em obter lucros de curto prazo. Steve Waldman, o ex-conselheiro sênior do presidente da Comissão Federal de Comunicações, propôs que esses canais fossem transformados em organizações sem fins lucrativos ou de propriedade local, o que é semelhante às propostas da Free Press e do acadêmico Victor Pickard

(4) Financiamento de fundações

O financiamento de fundações sustentou centenas, senão milhares, de pequenas startups em todo o mundo. Em 2020, muitas organizações estabeleceram fundos de emergência durante a pandemia e foram inundadas por candidatos ansiosos. A Google News Initiative financiou agências na América Latina, África, Ásia-Pacífico, Europa e Estados Unidos, fornecendo subsídios que variam de US$5.000 a US$30.000 para 5.300 redações selecionadas entre cerca de 12.000 candidatos.

Os governos latino-americanos têm feito pouco para apoiar o jornalismo, então são principalmente as fundações, o Google e o Facebook que intervêm para ajudar. O Facebook e o Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês) forneceram US$2 milhões em doações para veículos latino-americanos para ajudá-los a cobrir a crise da COVID-19 e também para sobreviver.

Lições aprendidas: 

Cada uma das categorias acima oferece alguma promessa de fornecer suporte mais substancial e sustentável para o jornalismo no futuro. No entanto, nenhuma basta por si só, especialmente porque a pandemia piora uma crise que já aumentava.

Embora o apoio filantrópico tenha possibilitado centenas, senão milhares, de meios de comunicação em todo o mundo, é necessário mais apoio sistêmico. Os exemplos acima oferecem algumas ideias.

Gostaríamos de ver mais coordenação de doadores e apoio do governo visando manter os canais existentes vivos e fortalecer o ecossistema de notícias local, em vez de financiar pequenas startups que podem acabar competindo entre si. Nossa pesquisa sugere que há muito a ser aprendido com países ao redor do mundo que fornecem apoio governamental para jornalismo de qualidade e tentam fazer com que empresas de grande tecnologia ajudem a pagar pelas notícias.


Dra. Anya Schiffrin é conferencista sênior na Faculdade de Assuntos Públicos e Internacionais da Universidade de Columbia. Ela escreveu o relatório com seus alunos: Hannah Clifford, Allynn McInerney, Kylie Tumiatti e Léa Allirajah. Outras pesquisas foram feitas por Chloe Oldham.

Imagem sob licença no Unsplash via Eric Muhr


https://ijnet.org/pt-br/story/4-alternativas-para-financiar-um-jornalismo-em-crise

Nível de confiança dos brasileiros na mídia é o 16º entre 28 países analisados e 72% acreditam que a imprensa não é isenta e objetiva, aponta estudo global

 

  • Governo é a instituição em que os brasileiros menos confiam, abaixo de mídia, ONGs e setor empresarial, o mais confiável
  • Brasil é um dos nove países com menor índice de confiança da população em seu governo dentre 28 analisados
  • Confiança global nas notícias veiculadas pela imprensa cai ao menor nível da série histórica

 Por Aldo De Luca | MediaTalks, Londres - 28.01.2021



Depois de atingir o índice mais alto durante o primeiro pico da pandemia no ano passado, a confiança global nas notícias da imprensa atinge agora o seu ponto mais baixo desde 2012. A conclusão é da edição 2021 do Edelman Trust Barometer, que ouviu mais de 33 mil pessoas globalmente.


O pico do ano passado

A agência Edelman tinha divulgado em maio uma pesquisa realizada em abril em 11 países (Brasil não incluído) que mostrara que a pandemia tinha feito a confiança nas notícias da imprensa tradicional atingir a marca de 69 pontos numa escala até 100, o ponto mais alto de sua série histórica, tomando 10 países como base comparativa. Em quatro meses, o índice subiu 7 pontos, o maior incremento verificado desde o início do estudo.


O mergulho deste ano

A edição 2021, que acaba de ser divulgada, mostra que esse aumento não se sustentou. Com base em dados do dobro de países (22), o levantamento demonstra que todas as fontes de notícias despencaram para suas mínimas históricas, no que o estudo chamou de “Falência da Informação”.

A confiança nas notícias gerais divulgadas pela imprensa tradicional caiu 8 pontos, a maior queda de sua série histórica e também a maior de todas as fontes analisadas ao longo do último ano.



Apesar da forte queda, a imprensa continuou como uma das duas fontes de notícias mais confiáveis, logo abaixo dos mecanismos de busca, que também tiveram uma queda significativa ao longo do último ano, de 6 pontos.

O pior índice foi o das notícias divulgadas pelas mídias sociais, que contam com a confiança de pouco mais de um terço (35%) dos respondentes.

Mais de sete entre dez brasileiros consideram que imprensa não é objetiva e isenta


Globalmente, 61% dos respondentes consideram que a imprensa não vem desempenhando bem o seu dever de ser objetiva e não partidária. Dez países mostraram-se ainda mais críticos, entre eles o Brasil.

Mais de sete em cada dez dos respondentes brasileiros (72%), a sétima maior marca entre os 27 países pesquisados, consideram que a imprensa não está fazendo um bom trabalho nesse sentido.

Além disso, quase seis em cada dez (59%) dos respondentes da amostra global consideram que as organizações de notícias estão mais preocupadas em apoiar uma ideologia ou uma posição política do que informar o público.


Quase 60% consideram que jornalistas estão propositalmente tentando enganar o público

Os jornalistas também foram mal avaliados. Uma parcela de 59% dos respondentes considera que os profissionais de imprensa estão propositalmente tentando enganar as pessoas dizendo coisas que sabem ser falsas ou exageradas. Esse percentual é maior do que o dos líderes governamentais (57%) ou empresariais (56%) que os respondentes consideram estarem fazendo o mesmo.

Confiança nos jornalistas caiu 5% no último ano

A confiança nos jornalistas da amostra dos 27 países caiu 5 pontos desde o ano passado, chegando à marca de 45 pontos numa escala de 100, acima apenas das avaliações de líderes religiosos ou governamentais. Os cientistas foram considerados os mais confiáveis, por 73% dos respondentes.



Índice de confiança dos brasileiros na mídia é o 16º entre 28 países pesquisados

Enquanto a confiança global na mídia aumentou dois pontos no último ano, a dos brasileiros cresceu o dobro, atingindo a marca de 48 pontos, pouco abaixo da média global de 51. O índice do Brasil é o 16º entre os 28 da base comparariva.

Assim como no Brasil, a confiança na mídia ao longo do último ano aumentou em 15 dos 27 países da base comparativa (a Nigéria passou a ser analisada este ano). Aconteceram quedas em nove, sendo as maiores na China (-10), Colômbia (-9) e México (-6). Os que mais confiam na mídia são os indonésios e os que menos confiam são os russos.

Confiança dos brasileiros na mídia só é maior do que no governo, cujo índice é um dos 9 piores dos 28 analisados

A pesquisa demonstrou que o menor índice de confiança dos brasileiros é no governo. Apesar de ter subido dois pontos ao longo do último ano, o percentual foi de 39%, um dos nove piores dos 28 países pesquisados.

O índice é bem menor do que a confiança dos brasileiros na mídia (48) e do que a média global de confiança nos governos, que aumentou três pontos e chegou a 53.

Ao contrário do aumento da confiança global no setor empresarial, que cresceu dois pontos no último ano, no Brasil a confiança nas corporações diminuiu três pontos, mas ainda assim garantiu ao setor a posição de instituição mais confiável do país entre as quatro analisadas.

O índice de confiança dos brasileiros no setor empresarial foi de 61, equivalente à média global, e pouco acima dos índices nas ONGs (56), mas bem superior ao da confiança na mídia (48) e no governo (39).

A confiança dos brasileiros no setor empresarial é a 16ª maior entre os 28 países analisados. O Brasil é um dos nove países dos 27 da base comparativa onde o índice caiu no último ano, enquanto subiu em 17. As maiores quedas aconteceram na China (-12) e na Tailândia (-6) e os maiores incrementos, na Austrália (+11) e na Arábia Saudita (+8). A maior confiança no setor empresarial foi verificada na Índia (82) e a menor, na Rússia (34).


Brasil cai duas posições no índice geral de confiança

Com os resultados dos setores analisados, o índice de confiança do Brasil, que é a média dos quatro indicadores, atingiu o índice de 51, igual ao obtido no ano anterior. Como outros países aprimoraram seus índices, o Brasil caiu duas posições no ranking geral e passou a ocupar o 16º lugar entre os 27 países da base comparativa.

A maior queda no índice geral de confiança foi a da China, com menos dez pontos, o que a fez cair para o segundo lugar, com 72 pontos, perdendo a liderança para a Índia. O maior crescimento foi o da Austrália, com 12 pontos, o que a fez subir oito posições e chegar ao 10º lugar, com 59 pontos.





Confiança global nas marcas internacionais brasileiras ficou no segundo nível mais baixo entre as pesquisadas

A pesquisa avaliou a confiança dos respondentes com relação às marcas globais de outros países. Foram consideradas marcas de 16 países e as brasileiras ficaram no segundo nível mais baixo, empatadas com 37 pontos com as marcas indianas e apenas um ponto à frente das mexicanas e chinesas.

O resultado chama atenção porque as marcas norte-americanas, britânicas, japonesas e australianas tiveram o seu pior resultado este ano desde o início da pesquisa. O índice de confiança nas marcas brasileiras caiu dois pontos em relação ao ano passado e ficou bem abaixo da média global de 53. As marcas globais de maior pontuação foram as suíças, alemãs e canadenses, com 66 pontos.


Responsabilidade informativa

A pesquisa revelou que apenas um em cada quatro dos respondentes (26%) tem boa responsabilidade informativa, caracterizada pelos hábitos de verificar a veracidade das informações recebidas, só repassar conteúdo verificado e evitar informações de “câmeras de eco” que repetem as mesmas informações. Quase quatro em cada dez dos respondentes reconheceram não tomar nenhum desses cuidados.



Infodemia tornou alfabetização mídiática prioritária

A boa notícia é que, com o aumento da disseminação de fake news verificada durante a pandemia, a alfabetização midiática foi considerada a segunda maior prioridade dos respondentes, logo depois das necessidades da família.


Aldo De Luca, Conselheiro e colaborador do MediaTalks byJ&Cia, é jornalista brasileiro radicado em Londres. Formado em Jornalismo pela UFF (Universidade Federal Fluminense), foi repórter especial do jornal O Globo em 1987 e 1988. Fundou junto com Luciana Gurgel a agência Publicom, que se tornou uma das maiores empresas do setor no Brasil e em 2016 foi adquirida pela WeberShandwick (IPG Group). Além de jornalista, é Engenheiro pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Integra a FPA (UK Foreign Press Association).
O conteúdo do MediaTalks pode ser reproduzido desde que citados a fonte e o autor, com link para o original

https://mediatalks.com.br/pt/2021/01/29/estudo-global-mostra-indices-de-confianca-na-imprensa/



sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Marco regulatório e democratização da comunicação

 

Mídia

28/01/2021 10:39

Créditos da foto: (Reprodução/bit.ly/3pEy3P7)


Antes de abordar questões de perspectiva, farei um breve relato sobre alguns fatos históricos na área da Comunicação Brasileira, lembrando a luta pela Democratização da Mídia, uma vez que não contamos ainda com uma Regulação da Área, inclusive desde que a Televisão Brasileira nasceu, da iniciativa privada, em 1950.

Um fato significativo neste momento: o FORUM NACIONAL DA DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO-FNDC, símbolo de luta, reunindo várias Entidades, completa 30 anos agora, desde que foi criado em 1991. Podemos também relembrar outro fato marcante dessa luta dos movimentos sociais na área: o I FORUM DAS TVS PÚBLICAS, realizado em 2007, em Brasília, representando um forte movimento pela criação de um polo expandido de TVs Públicas que abrigasse as já existentes: comunitárias, universitárias, legislativas e educativas, além de uma estatal a ser criada, numa malha popular e democrática de expressão digital. Tudo isso tomava forma naquele momento e, então, contávamos com um movimento expressivo nesse campo e um governo progressista.

Não só a criação da Empresa Brasileira de Comunicação-EBC, mas, outros fatores, como a forte demanda e a luta, desde a Pró-CONFECOM, pela CONFERÊNCIA NACIONAL DE COMUNICAÇÃO, que ocorreu em 2009, mostravam que tínhamos elementos apontando em direção da criação de um Marco Regulatório para o setor. Esse era o sonho que movia um forte movimento democrático, ao mesmo tempo em que as mais de 200 emissoras públicas de televisão lutavam por melhores condições e Políticas Públicas para o setor. Esses são alguns dos elementos que podiam traçar um caminho e indicar uma possibilidade de criativa mudança no Campo da Comunicação no Brasil, o que, infelizmente, até agora não ocorreu. Ao contrário, tivemos muitos retrocessos.

No alvorecer do que chamamos de Golpe, interrompendo, em 2016, o mandato da Presidenta Dilma Rousseff, apesar de seus aspectos aparentemente institucionais, cito uma Medida Provisória, assinada pelo então Presidente em exercício, Rodrigo Maia (durante viagem ao exterior de Michel Temer), que surgia como vetor de forças em sentido exatamente contrário ao da primeira MP que criava a EBC, anos antes. Nesta última, a 744, era dissolvido justamente o centro democrático da empresa, o Conselho Curador. Um verdadeiro desmonte das principais estruturas da organização da EBC se inicia então e continua em curso.

É bom frisar que a inexistência de um Conselho gera inúmeros problemas. Não é por acaso que as estruturas organizacionais de Agências Reguladoras, em outros países, já com mecanismos de Regulação, contam sempre com a presença de Conselheiros oriundos da sociedade civil. Formado por representantes de vários segmentos, organizados através de Movimentos Sociais, o Controle Público foi e é uma das principais demandas dos ativistas e militantes na área de Comunicação com o objetivo de manter uma participação social, coletiva e plural, nos caminhos de empresas emissoras impedindo-as de se tornarem porta-vozes do Governo, sendo estatais ou de interesses privados, não sendo públicas.

Retomando o histórico, relembro ainda o ano de 2009, quando ocorreu o II Fórum de TVs Públicas, em Brasília, que terminou com recomendações importantes ao Governo Lula, ao Ministro da Comunicação do Governo, Franklin Martins e ao Ministro da Cultura, Juca Ferreira. Apesar da falta de um Marco Regulatório, o setor público de Comunicação e os Produtores Independentes de Conteúdos Audiovisuais tinham algum espaço de escuta para suas questões. O II Fórum apresentou em sua carta final pontos fundamentais para o avanço democrático na área.

*Abaixo citados entre outros:

“- a não exibição de publicidade de produto ou serviço em todas e qualquer uma das emissoras públicas estatais e não-estatais;.

- a criação de modelos de financiamento estáveis e integrados para todo o campo público de televisão;

- promover mecanismos entre produtoras independentes, TVs Públicas, Ministério da Cultura e Agencia Nacional de Cinema para produção de conteúdos.”

*Publicação do II Fórum de TVs Públicas. Brasília, 2009.

Esses acontecimentos mostravam o potencial de mobilização do setor. Coletivos, Sindicatos e Grupos de Pesquisa como o Barão de Itararé, o Coletivo Intervozes, Entidades como ABCCOM, Conselho Nacional de Cinema, CUT, Conselho Nacional de Psicologia, FNDC, FaleRio, entre outros, todos estavam muito mobilizados sobretudo com a perspectiva aberta pela I CONFÊRENCIA NACIONAL DE COMUNICAÇÃO, contando com a participação de diversos atores, sobretudo dos movimentos sociais democráticos, tornando-se o mais importante evento do Campo das Comunicações no Brasil.

Sobre CONFERÊNCIAS, é preciso ressaltar que o modelo que as define, unindo todo um determinado setor, um campo de atuação, para coletivamente elaborar um pacto, advém exatamente do modelo da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789) e a Declaração Universal dos Direitos Humanos (Organização das Nações Unidas - ONU, 1948).

O aspecto mais importante é o fato de haver um pacto social, uma Conferência, para que todos os atores presentes possam chegar a um consenso e elaborar um Marco Regulatório seja geral e universal, seja setorial. Esse aspecto marca todas as Conferências de Área que buscam estabelecer uma Regulação. Foi assim também com a I CONFECOM, fato inovador na área da Comunicação Social, que promoveu, durante seu evento, em Brasília, mais de 600 propostas que nunca, porém, foram totalmente sistematizadas para se tornarem, efetivamente, um conjunto de leis. No entanto, esse momento histórico, tão esperado, a CONFECOM, jamais sairá da memória de todos que estávamos lá, a discutir o modelo ideal para uma Comunicação Democrática no Brasil. Uma grande emoção, momentos inesquecíveis, muitas inteligências juntas e muitos sonhos produzidos em total liberdade.

Revisitando a estrutura de Conferência, no sentido do CONTRATO SOCIAL, de Jean-Jacques Rousseau, encontramos nesse genial tratado, percorrendo inúmeros aspectos que implicam um amplo debate entre vários atores, um pré-modelo das atuais Conferências Setoriais. Sem dúvida, na época, a Carta dos Direitos do Homem e do Cidadão surgiu como Marco Regulatório dos Direitos Humanos. Como estrutura, Carta e Marco, Conferência e Contrato, possuem assim ligações paradigmáticas. A Conferência é a luz que a área da Comunicação necessita para que a ideia de Democracia cumpra seu papel e também para que uma Rede Pública de Televisão Digital, inovadora e convergente, possa, inclusive, iluminar uma nova cena sociopolítica, pautada pelos princípios da Cidadania.

Outro aspecto importante a ser ressaltado numa Regulação da Comunicação é a ideia de que o Espectro Eletromagnético é um bem público. Portanto, poderíamos pensar que toda Radiodifusão parte de uma base pública, o Espectro. Nesse caso, alguns mesmos critérios poderiam ser aplicados a qualquer emissora desde que as Concessões fossem tratadas como questões de Políticas Públicas. Outorgar uma faixa do Espectro Eletromagnético Público permite que governo, população e movimentos sociais acompanhem, façam parte e discutam dentro de uma estrutura de gestão pública, com conselhos, reuniões e critérios claros, as Concessões e todas as questões consideradas de interesse da população, referentes à continuidade de uma outorga.

Critérios educativos e culturais devem pautar a utilização e exploração do Espectro, pois os critérios quantitativos e, portanto, não qualitativos, comerciais, pautados pela audiência ou por uma falsa representatividade cultural podem ser insuficientes para que um Bem Público esteja nas mãos de uma empresa privada com seus interesses de lucro, dentro da lógica da Economia de Mercado.

Não há, aqui, necessidade de uma longa explicação sobre a evidente responsabilidade social, por exemplo, de uma empresa de negócios particulares diante de uma Concessão de Direito Público, o que até poderia ser inviável conforme o caso. Portanto, é preciso haver contratos de Concessão regidos por legislações claras e que funcionem na prática. Assim, teríamos um conceito bastante ampliado de TV Pública, se pensarmos que sendo todo o Espectro eletromagnético um bem público, automaticamente, toda radiodifusão deveria ser considerada pública.

E mais, todo o setor de Comunicações deveria ser considerado de interesse público e ser tratado dentro de uma perspectiva de Políticas Públicas e de Direitos Humanos fundamentais, incluindo o setor de Telecomunicações e as Novas Mídias Digitais. Embora já haja uma Lei da Internet, de 2014 e uma Nova Lei do Cabo, de 2011, as mesmas deverão ser incluídas num futuro Marco Regulatório Geral, que poderia também, caso seja esse o entendimento de todos, abranger a, já existente, Agência Nacional de Cinema-ANCINE.

Enfim, por enquanto, estamos em pleno caos “desregulatório” e todos os problemas na área, inclusive os de censuras e abusos políticos, decorrem do fato de não termos aqui uma Legislação e uma Agência Regulatória, frutos de um entendimento de que a Comunicação deve ser tratada como Política de Estado, estratégica, cada vez mais estratégica, devendo garantir a Democracia Popular, a Soberania dos Povos e o Exercício da Cidadania, em ambiente digital e pós-pandêmico. Espero!

Heloísa Toledo Machado é professora titular do departamento de Cinema-Instituto de Arte e Comunicação Social-IACS da UFF (Universidade Federal Fluminense); doutorado em Paris III, pós-Doutorado na Universidade de Lisboa; coordena Projeto de Pesquisa A TV Pública/Digital e a produção de conteúdos ficcionais como fatores de transformação sociocultural


https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Midia-e-Redes-Sociais/Marco-regulatorio-e-democratizacao-da-comunicacao/12/49803

Gostaria que abríssemos um debate sobre este importante tema:

quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

CRESCE NÚMERO DE PAÍSES ONDE HÁ PRÁTICA DE DESINFORMAÇÃO POLÍTICA POR MEIO DIGITAL

 REDES SOCIAIS

O estudo do Oxford Internet Institute indica que a utilização de tropas cibernéticas para espalhar desinformação tem se profissionalizado, inclusive no Brasil




Um estudo realizado pelo Internet Institute da Universidade de Oxford concluiu que a manipulação de campanhas políticas nas redes sociais continua se alastrando pelo mundo. De 70 países que foram afetados em 2019, saltou-se para 81 em 2020. Dentre esses países, está o Brasil. Isso indica a crescente ameaça da desinformação nas mídias sociais às democracias ao redor do mundo.

O relatório apontou para três tendências que envolvem propagandas nos meios digitais. Além do aumento da utilização de tropas cibernéticas como forma de espalhar desinformação e propaganda, esses movimentos têm se profissionalizado e, inclusive, sido procurados por agentes públicos.

Em 48 países, agentes de Estado contrataram empresas privadas para realizar campanhas manipulativas. Essas empresas acumularam receitas de US$ 60 milhões desde 2009. O Facebook relatou que já foram gastos US$ 10 milhões em propaganda política por tropas cibernéticas ao redor do mundo em sua plataforma. A desinformação passou a ser produzida em escala industrial por governos, empresas de relações públicas e partidos políticos.

BRASIL

No Brasil, a pesquisa identificou três propagadores de desinformação: agências do governo, políticos e partidos, inciativa privada e cidadãos e influenciadores. Apenas organizações da sociedade civil não foram consideradas disseminadoras de manipulação cibernética.

A última tendência do relatório diz respeito a movimentação recente das mídias sociais, que até então se declaravam neutras. As redes deletaram 317 mil contas e páginas de tropas cibernéticas entre janeiro de 2019 e novembro de 2020. Em um dos episódios mais recentes, diversas plataformas suspenderam a conta do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, após a invasão do Congresso em Washington por militantes da extrema-direita.

“Agora mais do que nunca, o público precisa ser capaz de depender em informações confiáveis sobre a política e atividade do governo. Redes sociais precisam melhorar seu jogo, aumentando seus esforços para indicar desinformação e fechar contas de fake news sem a necessidade da intervenção do governo”, defendeu Philip Howard, diretor do Oxford Internet Institute e co-autor do relatório.

ESTRATÉGIAS DE DESINFORMAÇÃO

Para espalhar desinformação, as contas gerenciadas por seres humanos são as mais empregadas. Apesar de menos automatizadas, a pesquisa encontrou essa técnica em 79 países. Estratégia que, não raro, conta com voluntários da sociedade civil. 57 países utilizam contas de bot, enquanto uma minoria de 14 países utilizam contas hackeadas ou roubadas. De todas as estratégias citadas, a única em que o Brasil não utiliza é de contas hackeadas ou roubadas.

A criação de conteúdo falso e veículos manipulatórios é a mais comum forme de causar desinformação, encontrada em 76 países. No Brasil, o Jornal da Cidade Online foi denunciado pelo Sleep Giants Brasil como propagador de fake news, enquanto Allan dos Santos, criador do site Terça Livre, ainda responde à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito das Fake News. O Governo Bolsonaro chegou a pagar R$ 2 milhões em anúncios para o site, segundo levantamento da Comissão.

Além disso, trolls patrocinados pelo estado para atacar oponentes políticos ou ativistas foram registrados em 59 países em 2020, incluindo o Brasil. Também figuramos em os 30 países onde há uso de dados para direcionar conteúdo de propaganda política. Ainda, sete países empregam estratégia de denúnciar em massa posts de jornalistas, ativistas e vozes dissidentes. Mas o Brasil não figura neste grupo.


https://www.telesintese.com.br/cresce-numero-de-paises-onde-ha-pratica-de-desinformacao-politica-por-meio-digital/

quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Livro-bomba de Cunha reconhece golpe contra Dilma e detona Temer, PSDB, Maia e até Baleia Rossi (leia a introdução)

 Protagonista do golpe de 2016, Eduardo Cunha reconhece o que todos sabem – que Dilma foi golpeada – e diz que o PT vive hoje "síndrome de Estocolmo" por se aliar a Baleia Rossi, deputado que é aliado de Michel Temer e Rodrigo Maia, dos dos principais articuladores deste processo