A região segue asfixiada em monóxido de carbono, mas a fumaça precisou atingir o Sudeste para causar revolta.
Newsletter Intercept Brasil | Sábado, 21 de setembro de 2024
Foto: Jader Souza/ Agência Brasil |
Preste atenção no mapa logo abaixo. Tire os olhos do Sudeste e veja os pontos escuros que pairam sobre a região Norte do Brasil. Isso é a concentração de monóxido de carbono na atmosfera entre julho e setembro de 2024.
O gás tóxico, que vai aumentando com o passar dos dias, é resultado da fumaça produzida pelas queimadas do agro.
Mais de 50 mil focos de incêndio foram registrados na Amazônia até o fim de agosto.
O gráfico que você vê aqui foi feito pelo divulgador científico Bruno Brezenski.
Com base em sistemas de monitoramento por satélite, ele observou que a região Norte é o epicentro da concentração do monóxido de carbono no país.
O pico de emissão do gás tóxico foi entre os dias 27 de agosto e 4 de setembro, com os incêndios criminosos.
As cidades mais afetadas estão nos estados de Rondônia, do Acre e do Amazonas.
Nesse período, o índice de emissão de monóxido de carbono na região atingiu cerca de 50 partes por milhão por mais de cinco horas seguidas em alguns momentos.
De acordo com o Conselho Nacional do Meio Ambiente, uma pessoa só deveria ficar exposta a um índice de, no máximo, 35 partes por milhão por até uma hora.
Quando inalado, monóxido de carbono provoca dor de cabeça, enjoos, sonolência e confusão mental. Se o tempo de exposição for muito grande, a pessoa pode sofrer um envenenamento grave e morrer.
O problema é maior porque o monóxido de carbono é apenas um dos compostos emitidos pela fumaça das queimadas. Uma estimativa feita pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia mostrou o impacto dos incêndios ocorridos na Amazônia entre junho e agosto de 2024.
Nesse período, foram queimados mais de dois milhões de hectares de floresta e emitidos 31,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente, ou seja, uma junção de gases de efeito estufa que causam o aquecimento global. Isso é quase o que a Noruega emite no ano inteiro.
A situação está longe de se resolver. O ar intragável devido às queimadas se junta à seca dos rios e leva o Amazonas a um cenário ambiental crítico. Na última quinta-feira, dia 19, Manaus amanheceu novamente encoberta por fumaça.
De acordo com o monitoramento do Sistema Eletrônico de Vigilância Ambiental, a qualidade do ar na capital é péssima em alguns bairros, especialmente na zona sul.
O índice no bairro Aparecida chegou a 207 microgramas por metro cúbico de ar. Para ser considerado de boa qualidade, esse número deve ficar entre 0 e 25 microgramas por metro cúbico de ar.
Segundo o médico patologista Paulo Saldiva, um dos maiores especialistas quando o assunto são os efeitos das queimadas na saúde, o nível de poluição causada pela fumaça é mais intenso no Norte do que em outras regiões. "Isso já acontecia há muito tempo, mas agora começou a ser notado em todo o Brasil", me disse Saldiva nesta entrevista.
De fato, não é de hoje que a população do Norte vive sufocada pela fumaça do agro, mas o problema só virou assunto nacional depois que os moradores do Sudeste amanheceram com o céu encoberto. O mesmo aconteceu no ano passado.
Entre setembro e outubro de 2023, Manaus e a região metropolitana passaram cerca de um mês encobertas por uma espessa camada cinza. Segundo dados do relatório Mundial da Qualidade do Ar, nesse período, a capital foi considerada o pior lugar do mundo para respirar.
Naquela época, eu fiz uma reportagem mostrando que a destruição da floresta por agropecuaristas na região metropolitana de Manaus ao longo de décadas era uma das explicações para o que estava acontecendo.
Também revelamos os nomes de alguns desses desmatadores – tinha até avô do tiktoker da capivara entre eles.
O Brasil continuará a queimar até que responsabilizemos os culpados – inclusive a imprensa que finge que “agro é pop”.
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Ninguém aguenta mais ser sufocado por fumaça, mas quem se importa se o problema for pior para quem vive no Norte?
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