terça-feira, 2 de agosto de 2022

Justiça federal condena cabeças do esquema de desvios na Sudam em Altamira PÁ

Escândalo revelou o método seguido por outras empresas e provocou a extinção da Sudam no início dos anos 2000 
 
Reportagem: Val-André Mutran | Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.| Publicado em 02/08/2022 | às 19:52

Brasília – Os cabeças de um engenhoso golpe contra o erário da União, copiado à exaustão, finalmente foram condenados a devolverem cerca de R$ 20 milhões aos cofres públicos por desvios de verbas da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). O processo, denunciado pelo Ministério Público Federal em Altamira, há 15 anos, em 2007, revelou um golpe milionário com recursos do Fundo de Investimentos da Amazônia (Finam).

A sentença condenou os empresários Laudelino Délio Fernandes, Francílio Valdenor Pinheiro e a contadora Maria Auxiliadora Barra Martins, cujo modus operandi, fez escola na região amazônica. O golpe da Agropecuária Pedra Roxa foi imitado por outras dezenas de empresas, revelando, quando descoberto, um método de corrupção de tal ordem que provocou no ano 2000, a extinção da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) devido à “pororoca” de casos de corrupção, que ocorreram no auge da era FHC, de 1° de janeiro de 1995 a 1° de janeiro de 2003.

Script do golpe

As investigações das autoridades federais (MPF-PA, PF-PA e Receita Federal-PA) revelou que Francílio Valdenor Pinheiro aparecia na documentação como sócio proprietário da Agropecuária Pedra Roxa, enquanto Laudelino Délio, apesar de não constar no quadro societário, foi apontado por auditoria da Receita Federal como o verdadeiro proprietário da empresa.

Auxiliados pela contadora Maria Auxiliadora Barra Martins, conseguiram montar a documentação exigida para receber um financiamento pleiteado de R$ 5,1 milhões do Fundo de Investimentos da Amazônia (Finam). A empresa agropecuária, deveria investir uma contrapartida de igual valor. Em vez disso, o valor recebido foi repassado a diversas outras empresas envolvidas no esquema e as contrapartidas foram ilegalmente comprovadas por meio de notas fiscais fraudadas.

Cada um dos réus foi condenado a pagar R$ 5 milhões pelos desvios por danos morais à coletividade. Também devem devolver, em conjunto, o valor de R$ 5,1 milhões desviados do Finam.

Esquema

Ainda de acordo com as investigações, a empresa integrava um esquema de várias outras que “utilizavam dos recursos do Finam para integralizar capital das pessoas jurídicas candidatas ao recebimento dos valores oriundos de benefício fiscal, de modo que o valor recebido por uma empresa era emprestado a outra, a fim de mascarar sua capacidade econômica, isso porque era necessária contrapartida em valor idêntico ao tomado do fundo”.

Dessa forma, o dinheiro de uma empresa era repassado imediatamente à outra, que com isso comprovava possuir capital suficiente para a contrapartida obrigatória dos recursos recebidos da própria Sudam. Assim que o financiamento era pago, novamente a verba era transferida para outra empresa. Grande parte das empresas envolvidas no esquema funcionava na região de Altamira, no oeste do Pará, mas o golpe se disseminou como praga em toda a região amazônica até ser descoberto.

No momento em que as empresas deveriam comprovar a utilização dos recursos na instalação de projetos agropecuários, iniciava a outra etapa do esquema, que consistia em apresentar notas fiscais falsas para a Sudam. Todas as fraudes foram comprovadas nas investigações da PF e da Receita Federal. Foram descobertas dezenas de notas fiscais falsificadas para justificar serviços e bens nunca realizados ou adquiridos.

Fábrica de notas frias

Nessa época, outra “indústria” prosperou do nada e chegou para ficar na região: as fábricas de notas fiscais frias para abastecer o apetite insaciável de empresários vigaristas e prefeitos corruptos.

A sentença aos “inventores do golpe” registra a ousadia com que agiram na certeza da impunidade. Na apuração da Receita, calculou-se que, “do valor total liberado, R$ 4,5 milhões foram desviados do projeto, com a apresentação de notas fiscais, recibos e contratos inidôneos, o restante empregado de maneira incorreta”. Uma das notas fiscais falsas estava em nome da empresa Terranorte Terraplanagem Construção e Mecânica, com declaração de pagamento no valor de R$ 1,9 milhão. A empresa, “após ser intimada pela auditoria, informou que as notas fiscais não existem em seu acervo, mencionando que a assinatura aposta nos documentos seria falsificada”.

A sentença inclui vários outros exemplos de notas frias, como a compra de grande quantidade de vasilhames de vidro, o que não combina com os objetivos declarados da empresa, de implantação de cultura de cacau e pecuária. Em depoimento, o verdadeiro proprietário da Agropecuária Pedra Roxa, Laudelino Délio Fernandes, afirmou que havia apenas desorganização das contas da empresa, sem juntar nenhuma prova do que dizia.

Em resposta, a sentença da Justiça Federal registra que “a falsa declaração de destinação das notas fiscais é visível, como se constata dos documentos nos apensos e relatório de auditoria, que categoricamente demonstram que os requeridos utilizavam de notas inidôneas e cheques falsos com o intuito de comprovar a devida utilização dos recursos”.

A Justiça entendeu que os condenados devem indenizar a coletividade em danos morais porque foram responsáveis por comprometer uma “política pública importante ao desenvolvimento da região Norte quanto pelo modus operandi utilizado para ludibriar as autoridades públicas”. Com isso, contribuíram para deslegitimar uma política importante para o desenvolvimento da Amazônia.

Com informações da Comunicação do MPF

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.

 

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